CONFLITOS
DOMÉSTICOS
Um
dos mais graves problemas humanos está na dificuldade de convivência
no lar. Pessoas que enfrentam desajustes físicos e psíquicos têm,
não raro, uma história de incompatibilidade familiar, marcada por
frequentes conflitos.
Há
quem os resolva de forma sumária: o marido que desaparece, a esposa
que pede divórcio, o filho que opta por morar distante.
Justificando-se
em face das tempestades domésticas alguns espíritas utilizam o
conhecimento doutrinário para curiosas racionalizações:
-
Minha mulher é o meu carma: neurótica, agressiva, desequilibrada.
Que fiz de errado no passado, meu Deus, para merecer esse “trem”?
-
Só o Espiritismo para me fazer tolerar meu marido. Aguento hoje para
me livrar depois. Se o deixar agora terei que voltar a seu lado em
nova encarnação. Deus me livre! Resgatando meu débito não quero
vê-lo nunca mais!
Conversávamos
com idosa confreira que teve conturbada convivência com o esposo,
falecido há alguns anos. E lhe dizíamos, brincando:
-
A senhora vai ficar feliz quando desencarnar. Reencontrará seu
querido. Ele a espera...
A
resposta veio pronta, incisiva:
-
Isso nunca! Prefiro ir para o inferno!
Um
pai nos dizia:
-
Certamente há um grave problema entre mim e meu filho, relacionado
com o passado. Em certas ocasiões sinto vontade de esganá-lo. Ele
me desafia, olha-me com ódio. Preciso controlar-me muito para não
perder a cabeça.
Realmente,
nesses relacionamentos explosivos que ocorrem em muitos lares há o
que poderiamos definir como “compromisso cármico”. Espíritos
que se prejudicaram uns aos outros e que, não raro, foram inimigos
ferozes, reencontram-se no reduto doméstico.
Unidos
não por afetividade, nem por afinidade, e sim por imperativos de
reconciliação, no cumprimento das leis divinas, enfrentam inegáveis
dificuldades para a harmonização, mesmo porque conservam,
inconscientemente, a mágoa do passado. Daí as desavenças fáceis
que conturbam a vida familiar. Naturalmente situações assim não
interessam à nossa economia física e psíquica e acabam por nos
desajustar.
*
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*
Imperioso
considerar, todavia, que esses desencontros são decorrentes muito
mais de nosso comportamento no presente do que dos compromissos do
pretérito. Não seria razoável Deus nos reunir no lar para nos
agredirmos e magoarmos uns aos outros.
Ouvimos,
certa leita, de Henrique Rodrigues, conhecido expositor espírita,
uma expressão feliz a respeito do assunto:
“Deus
espera que nos amemos e não que nos amassemos”.
E
incrível, mas somos ainda tão duros de coração, como dizia Jesus,
que não conseguimos conviver pacificamente. Reunamos duas ou mais
pessoas numa atividade qualquer e mais cedo ou mais tarde surgirão
desentendimentos e desarmonia. Isso ocorre principalmente no lar,
onde não há o verniz social e damos livre curso ao que somos,
exercitando o mais conturbador de todos os sentimentos, que é a
agressividade.
Neste
particular, o estilete mais pontiagudo, de efeito devastador, é o
palavrão. Pronunciado sempre com entonação negativa, de desprezo,
deboche ou cólera, é qual raio fulminante. Se o familiar agredido
responde no mesmo diapasão, o que geralmente acontece, “explode”
o ambiente, favorecendo a infiltração de forças das sombras. A
partir daí tudo pode acontecer: gritos, troca de insultos, graves
ofensas e até agressões físicas, sucedidos, invariavelmente, por
estados depressivos que desembocam, geralmente, em males físicos e
psíquicos.
Se
desejamos melhorar o ambiente doméstico, em favor da harmonização,
o primeiro passo é inverter o processo de cobrança.
Normalmente
os membros de uma casa esperam demais uns dos outros, reclamando
atenção, respeito, compreensão, tolerância... Amoral cristã
ensina que devemos cobrar tudo isso sim, e muito mais, mas de nós
mesmos, porquanto nossa harmonia íntima depende não do que
recebemos, mas do que damos. E, melhorando-nos, fatalmente
estimularemos os familiares a fazer o mesmo.
Todos
aprendemos pelo exemplo, até o amor. Está demonstrado que crianças
carentes de afeto têm muita dificuldade para amar. Será que estamos
dando amoraos familiares?
Não
é fácil fazê-lo porquanto somos Espíritos muito imperfeitos. Mas
foi para nos ajudar que Jesus esteve entre nós, ensinando-nos como
conviver harmoniosamente com o semelhante, exercitando valores de
humildade e sacrifício, marcados indelevelmente pela manjedoura e
pela cruz.
Um
companheiro afirma, desalentado:
-
Tenho feito todo o possível para harmonizar-me com minha esposa,
cumprindo o Evangelho. Esforço quase inútil, porquanto ela é uma
pessoa intratável, sempre irritada e agressiva. Não sei o que
fazer...
Talvez
lhe falte um tanto mais de perseverança, já que é impossível
alguém resistir indefinidamente à ação do Bem. Parta-se do
princípio lógico: “Quando um não quer, dois não brigam”. Não
existem brigas unilaterais.
Em
qualquer circunstância, em tavor de nossa paz, é importante
perseverarmos nos bons propósitos, cumprindo a recomendação de
Jesus: Perdoar não sete vezes, mas setenta vezes sete.
Quem
sempre perdoa, mantém sempre o próprio equilíbrio.
A
propósito, no livro “A Sombra do Abacateiro” o autor, Carlos A.
Baccelli, reporta-se a sugestivo episódio relatado por Francisco
Cândido Xavier. Diz o querido médium:
“Em
Pedro Leopoldo, fomos procurado por uma senhora sofredora que era
casada há dezoito anos... Tinha lições difíceis para dar; seu
esposo e seus dois filhos eram complicados; era obrigada a pensar em
perdão, em bondade e em compaixão muitas vezes por dia.
“E
pedia a Emmanuel uma orientação. Ele respondeu que ela deveria
continuar perdoando sempre. Ela replicou que já estava cansada,
doente, ao que o nosso Benfeitor redarguiu, lembrando que existiam
milhões de pessoas no mundo, cansadas e doentes também... Emmanuel
recordou o que disse Jesus a Pedro - perdoarás setenta vezes sete.
“Aquela
irmã respondeu, então: - Olha, meu caro Amigo, eu já fiz as contas
e eu já ultrapassei, em dezoito anos, o número quatrocentos e
noventa...
“Depois
de uma breve pausa, Emmanuel lhe falou, por fim: - Mas você se
esqueceu de uma coisa; é perdoar setenta vezes sete cada ofensa... ”
-
Exerça severa vigilância sobre o que fala. Geralmente as desavenças
no lar têm origem no destempero verbal.
-
Diante de familiares difíceis, não diga: “É minha cruz!” O
único peso que carregamos, capaz de esmagar a alegria e o bom-ânimo,
é o de nossa milenar rebeldia ante os sábios desígnios de Deus.
-
Elogie as virtudes do familiar, ainda que incipientes, e jamais
critique seus defeitos. Como plantinhas tenras, tanto uns como outros
crescem na proporção em que os alimentamos.
-
Evite, no lar, hábitos e atitudes não compatíveis com as normas de
civilidade vigentes na vida social. Sem respeito pelos companheiros
de jornada evolutiva fica difícil sustentar a harmonia doméstica.
-
Cultive o diálogo. Diz André Luiz que quando os componentes de um
lar perdem o gosto pela conversa, a afetividade logo deixa a família.
Fonte:
Uma Razão para Viver (Richard Simonetti. Editora CEAC. 1989)
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